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18 de Abril de 2024
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    AÇÃO CIVIL PÚBLICA

    Publicado por OAB - Sergipe
    há 13 anos

    Legitimação da OAB para propor ação civil pública em defesa dos interesses difusos da sociedade.

    * Maurício Gentil

    Uma vertente jurisprudencial de risco para a proteção processual dos interesses da sociedade vem ganhando corpo no Poder Judiciário. Trata-se da corrente interpretativa que restringe a legitimidade da Ordem dos Advogados do Brasil para a propositura de ação civil pública, limitando-a para casos em que atue na defesa de interesses dos advogados e excluindo-a naquelas outras situações em que a OAB atua na defesa dos interesses difusos da sociedade.

    Essa corrente se propaga em Tribunais Regionais Federais do país e já conta com algumas decisões, nesse mesmo sentido, do Superior Tribunal de Justiça. E é com muita preocupação que vemos alguns Juízes Federais da Seção Judiciária do Estado de Sergipe a adotar esse entendimento.

    Importa registrar que a Ordem dos Advogados do Brasil é uma entidade independente , que não mantém com a Administração Pública ou o Governo qualquer vínculo de subordinação ou hierarquia. Esse status decorre de sua legitimidade histórica e de expressa garantia legal, estabelecida na Lei nº 8.906/94 (que institui o Estatuto da Advocacia e da OAB) , no 1º do Art. 44: A OAB não mantém com órgão da Administração Pública qualquer vínculo funcional ou hierárquico".

    Formada exclusivamente por advogados, e mantida pelas anuidades pagas pelos advogados, a Ordem dos Advogados do Brasil possui, dentre as suas finalidades institucionais, a de defesa da Constituição e dos direitos da sociedade . Tudo conforme prevê a Constituição da República, ao expressar que o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil é entidade legitimada à propositura de ação direta de inconstitucionalidade ( Art. 103. Podem propor ação direta de inconstitucionalidade: (...) VII o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil;) . Nessa atuação, é tratado pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal como legitimado universal , ou seja, pode propor essa ação em face de leis e atos normativos que versem sobre qualquer tema, e não apenas sobre temas relacionados à advocacia (não se lhe exige, portanto, a demonstração de pertinência temática).

    Não é por outra razão, portanto, que a Lei nº 8.906/94 , ao indicar as finalidades institucionais da OAB , aduziu ser a defesa da Constituição e da sociedade uma delas: Art. 44. A Ordem dos Advogados do Brasil OAB, serviço público, dotada de personalidade jurídica e forma federativa, tem por finalidade: I defender a Constituição, a ordem jurídica do Estado democrático de direito, os direitos humanos, a justiça social , e pugnar pela boa aplicação das leis, pela rápida administração da justiça e pelo aperfeiçoamento da cultura e das instituições jurídicas (grifou-se).

    Um dos instrumentos que a lei disponibiliza à OAB nessa sua atuação em defesa dos direitos humanos, da justiça social e do Estado Democrático de Direito é a sua expressa legitimação para propositura da ação civil pública, conforme dispõe o Art. 54 da Lei nº 8.906/94:

    Art. 54. Compete ao Conselho Federal:

    (...) XIV ajuizar ação direta de inconstitucionalidade de normas legais e atos normativos, ação civil pública , mandado de segurança coletivo, mandado de injunção e demais ações cuja legitimação para agir lhe seja outorgada por lei; (grifou-se).

    E cada Conselho Seccional da OAB , conforme dispõe o Art. 57 da mesma lei , (...) exerce e observa, no respectivo território, as competências , vedações e funções atribuídas ao Conselho Federal , no que couber e no âmbito de sua competência material e territorial, e as normas gerais estabelecidas nesta lei, no Regulamento Geral, no Código de Ética e Disciplina e nos Provimentos. .

    Nunca é demais recordar que a Constituição da República, ao estabelecer que uma dentre muitas - das funções institucionais do Ministério Público é a propositura de ação civil pública (Art. 129, inciso III), dispõe que a legitimação do Ministério Público para as ações civis previstas neste artigo não impede a de terceiros, nas mesmas hipóteses, segundo o disposto nesta Constituição e na lei (Art. 129, 1º).

    E é a lei que dispõe quais são os direitos e interesses que podem ser defendidos em juízo por meio da ação civil pública: a) meio ambiente; b) consumidor; c) ordem urbanística; d) bens e direitos de valor artístico, estético, histórico e paisagístico; d) qualquer outro interesse difuso ou coletivo ; e) infração da ordem econômica e da economia popular (Art. , incisos I a VI da Lei da Ação Civil Pública Lei nº 7.347/85).

    A conclusão a que se chega é cartesiana. Se a OAB pode propor ação civil pública, e se a ação civil pública pode ser proposta para a defesa, em juízo, de qualquer outro interesse difuso ou coletivo, a OAB pode, sim, propor ação civil pública em defesa de interesses difusos e coletivos, o que também traduz atendimento de suas finalidades institucionais (Art. 44, inciso I da Lei nº 8.906/94).

    Essa legitimação da OAB para a propositura de ação civil pública em defesa dos interesses difusos da sociedade já foi bem reconhecida pela Justiça Federal Sergipana, em mais de uma ocasião . Apontem-se, por exemplo, as seguintes:

    (...) Inquestionável a legitimação autoral para a propositura da ação civil pública, na espécie, pois o Conselho Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil OAB/SE, nos termos dos artigos544, inciso XIV e577 da Lei nº8906666666/94, pode figurar como acionante na espécie versada nos autos, além do que, em tese, age, no caso, a OAB, em defesa dos interesses difusos da sociedade , caracterizado no legítimo provimento dos cargos públicos, especialmente os cargos políticos (o de Secretário de Estado), bem assim no correto exercício, pelos membros do Ministério Público, de suas funções, inclusive a observância às vedações constitucionais, todos titularizados difusamente, por toda a sociedade e administrados sergipanos; enfim, atua o Ministério Público na defesa da Ordem Jurídica, sobretudo a Ordem Constitucional, cuja supremacia é indeclinável (grifou-se) (Processo nº 2005.85.00.001626-5-Classe 05023-3ª Vara 03/05/2005);

    É de ver-se, ainda, que,na hipótese dos autos, a OAB atua amparada na regra do art. da Lei nº 7.347/85, especialmente nos seus incisos II, IV e V, pois, em tese, pretende salvaguardar o erário e os princípios da moralidade, impessoalidade, eficiência e legalidade administrativas, bem assim, a igualdade de oportunidades de acesso aos cargos públicos, à exigência de licitação para contratação de serviços públicos, interesses esses, indiscutivelmente, titularizados difusamente por toda a sociedade .

    No particular, comungo inteiramente com o ponto de vista adotado pela Procuradoria da República no Estado de Sergipe , exarado no Parecer já mencionado acima, onde sua Excelência o Dr. Procurador oficiante assevera, com muita felicidade, quanto à atuação da OAB no pólo ativo da relação processual que: a meu ver a iniciativa tendeclaramente à defesa do interesse difuso, para não dizer público, à lisura administrativae à obediência dos governantes e agentes públicos ao princípio da igualdade. . (grifou-se) (Processo nº 2004.85.00.1754-0 Classe 02000 3ª Vara).

    A OAB tem legitimidade para propor ação civil pública, nos termos do art. 54 da a Lei nº 8.906/94 (Estatuto da Advocacia) e, além do mais, no caso

    concreto dos autos, age a OAB em defesa dos interesses difusos da sociedade, conforme art. , V, da Lei nº 7.347/85, buscando, em tese a proteção do patrimônio público e do erário, pugnando pela prevalência dos princípios constitucionais que orientam a Administração Pública, inclusive o princípio da igualdade de regime jurídico entre os agentes administrativos.

    A OAB , na hipótese aventada nos autos, atua na defesa da ordem jurídica, do Estado Democrático de Direito e da proteção dos interesses difusos e coletivos e, quanto a isso, nenhuma outra instituição social está mais habilitada que a OAB para promover a presente ação civil pública, face ao seu caráter de entidade integrada no contexto nacional e estadual , inclusive exercendo o controle social e político sobre as instituições e agentes públicos, cumprindo-lhe propugnar pela constitucionalidade, legalidade e moralidade da gestão pública.

    A pertinência temática com direitos difusos e coletivos de interesse dos advogados não é exigida como requisito para a propositura da ação civil pública pela OAB, face à sua natureza de entidade que atua nas áreas e interesses acima expostos, não se podendo restringir onde a lei não estabeleceu limitações. (grifou-se) (Processo nº 3ª Vara - 27/02/2009).

    É portanto com muita preocupação que vemos ganhar corpo corrente interpretativa que restringe a legitimação da OAB para a propositura de ação civil pública apenas para defesa dos interesses dos advogados.

    Ressalte-se, aliás, que para a defesa dos interesses coletivos dos advogados, a OAB já dispõe do mandado de segurança coletivo , legitimação que lhe é conferida no mesmo dispositivo legal em que se lhe assegura a legitimação para propositura de ação civil pública (Art. 54, inciso XIV da Lei nº 8.906/94).

    Não faz maior sentido hermenêutico concluir que no mesmo dispositivo legal foi atribuída legitimação para agir em duas ações, mas com idêntico objetivo. Se era para atribuir legitimação à OAB para atuar apenas em defesa processual do interesse coletivo dos advogados, bastaria a menção ao mandado de segurança coletivo . Se a lei foi além, para expressamente atribuir-lhe legitimação para a propositura da ação civil pública, é porque reconheceu a importância de que a OAB, entidade independente e com histórica atuação em defesa da sociedade, possa, sim, propor ação civil pública em defesa dos interesses difusos e coletivos de toda a sociedade.

    A OAB resistirá a esse entendimento jurisprudencial. Recorrerá de decisões que restrinjam o seu âmbito de atuação processual em defesa da coletividade. Batalhará pelo convencimento dos julgadores, no sentido de que a OAB, por legitimação histórica e compromisso social, conquistou a previsão constitucional e legal de atuação processual em defesa da coletividade, da Constituição e do Estado Democrático de Direito. Para a sociedade, quanto mais órgãos e instituições possam atuar coletivamente na defesa dos seus interesses, melhor.

    Com efeito, a melhor estruturação de um sistema de proteção processual coletiva dos direitos fundamentais é medida que atualmente se impõe, e a restrição da legitimidade ativa da OAB para a propositura de ação civil pública vai na contramão dessa exigência contemporânea de celeridade e efetividade da prestação jurisdicional .

    * Maurício Gentil é vice-presidente no exercício do cargo de presidente da OAB/SE

    Enviado por Cassia Santana em qua, 15/12/2010 - 08:40. OAB/SE

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